Era um dia sombrio.
O Céu estava enevoado e uma chuva forte caia.
Ele desceu até à vila para comprar o jornal e umas quantas peças de fruta. Detestava ter que sair de casa com o tempo assim. Devia ter-se lembrado quando saíra da escola do recado dos pais.
Amaldiçoou-se de novo, ao mesmo tempo que um estrondoso relâmpago deu de si.
Compras feitas e regressar a casa.
Um frio insidioso tentava invadir-lhe até aos ossos. Abotoou mais a gabardina e ajeitou o gorro.
Nesse momento o vento levantou-se com força e virou-lhe o chapéu de chuva.
Quão estranho é o vento - feroz, inesperado e arrebatador!
Tal foi a força que após se retorcer todo, o chapéu saiu disparado das suas mãos e foi embater perto dum caixote do lixo, num beco ali perto.
Já tinha quase pensado em abandonar o chapéu, mas resolveu apanha-lo. Podia ser que tivesse conserto.
Percorreu alguns metros, saltitando entre poças e entre sacos do lixo rotos, entrou no beco.
Ali estava o chapéu, completamente partido. Mal se abaixou e viu as varetas todas partidas desistiu.
Foi nesse momento que ele o viu.
Ao erguer-se reparou como o beco era na verdade uma antiga entrada para carros de uma velha quinta abandonada.
A primeira sensação que teve foi de susto.
Mas conteve-se.
O estranho homem aprochegou-se fumando lentamente um cigarro.
Havia algo naqueles olhos que o amedrontavam e ao mesmo tempo o seduziam.
Reparou que o cigarro se apagou.
O estranho homem pegou numa caixa de fósforos e acendeu um fosforo, e enquanto olhava o jovem acendeu o cigarro.
Então sorriu e sem apagar o fosforo lançou-lho a ele.
O fosforo ardeu por uns segundos e apagou-se.
- Queres brincar com o fogo rapazinho?
O homem agachou-se e riu.
Depois ergueu-se e lançou ao jovem o resto da caixa de fósforos.
O jovem pareceu ter despertado de um sono.
Apanhou a caixa.
Ao erguer-se reparou que o homem já se afastara.
Guardou a caixa e foi a correr para casa.
Longo pareceu o caminho. Sentia-se estranhamente calmo e ao mesmo tempo estranhamente assustado.
Nunca antes vira tal sujeito.
Não que tivesse medo dele. Tinha 15 anos, um corpo razoável, se calhar um bocado franzino.
Chegou a casa praticamente ensopado.
Felizmente apenas a gabardina e o gorro apanharam a maioria da chuva, o resto da roupa estava seca.
Os pais ainda não tinham voltado.
Praticamente não via os pais.
A mãe era telefonista num hospital, a mais de 50km de casa.
O pai era carpinteiro, e dos bons, mas tinha os horários trocados, isso quando não se metia na pinga.
Apenas a velha senhora Dâmaso tomava conta dele de tarde, preparando o jantar e arranjando numa marmita o almoço que ele comeria depois na escola.
Ás vezes tinha também a Júlia. Juju arriba o cu como gozavam na escola. Júlia tinha 18 anos. Para ele eram praticamente da mesma idade. Mas a mãe confiava nela e por vezes, especialmente quando tinha 10 ou 11 anos contratava-a para lhe fazer companhia de noite.
A Senhora Dâmaso tinha saído já. Tinha o jantar já arranjado, bastava-lhe aquecer depois.
Havia tambem um recado anotado - O pai vem tarde. Tem biscate nos Arroles.
Nada do que já nao esperasse.
Com 15 anos podia pensar-se que assim criado seria um rebelde, mas não.
Já experimentara fumar e por vezes fazia-o, mas nada mais.
As raparigas não lhe ligavam assim tanto, e não era o mais popular da escola. Tinha alguns amigos - um deles o nerd Álvaro.
Adorava ler.
Fechou a porta de casa e sentou-se a ver televisão.
Nada de jeito. Mas mais tarde ia dar uma serie de Crimes misteriosos. Iria ver?
Se visse se calhar teria pesadelos. Se não visse morreria de curiosidade.
Buscou na cozinha um copo de leite e bebeu-o com avidez.
Abriu a porta da rua e foi até barracão alimentar o Leo, o seu cachorrinho.
A chuva parecia cair ainda com mais força.
Reparou ao longe que a vivenda de Júlia tinha as luzes apagadas. Estranho....naquela casa tudo abusava da electricidade.
O cachorro saltou de contente. Hoje podia leva-lo para dentro.....se ele não tivesse todo sujo.
-Ora bolas Leo...tás todo cagado...meteste as patas no cócó e deitaste-te em cima da comida para os porcos.
Pegou num pano e limpou o maior. Nada feito....estava mais limpo mas tinha um cheiro insuportável.
Deu-lhe mais uns biscoitos e saiu.
Hoje teria de ficar sozinho.
Fechou o barracão... o dia sumia-se a olhos vistos.
Olhou o relogio de pulso - 18h.
Mal trancou a porta, dirigiu-se ao quarto e sentou-se na cama enquanto lia um conto de mistérios...
A noite caiu e uma coruja piou.
CONTINUA... i hope so
Sem comentários:
Enviar um comentário